O VOTO PERPÉTUO DE HOGWARTS


Lembro nitidamente do comercial da coca cola onde conheci Harry Potter pela primeira vez. Na propaganda era prometido para aquele que ganhasse a promoção conhecer os estúdios do filme que estava sendo produzido. Fiquei totalmente intrigado e comecei a tentar me informar mais sobre o assunto.
Percebi que não fui o único que estava encantado por um mundo que só ouvia falar. Não tinha condições de comprar os livros, então pegava fragmentos desse mundo mágico por pessoas que já haviam lido, que foram para fora do país ou por reportagem que eram lançadas na televisão de outras pessoas, pois não tinha em minha casa.
Minha vó veio nos visitar e, por saber que eu adorava ler, trouxe os 3 primeiros livros. Foi um dos melhores presentes que já recebi na vida. Nem soube agradecer. Nessa época eu tinha 11 anos, a idade em que Harry iniciava suas aventuras no mundo bruxo e me senti inteiramente conectado, como já imaginava.
Dentro de um dia li o primeiro livro inteiro, o segundo em dois dias, pois minha mãe começou a brigar comigo para comer, dormir e largar os livros, e o terceiro terminei em um mês devido às ameaças de ter o livro escondido.
Os livros desde então me acompanharam na minha trajetória da infância para a fase adulta, me guiaram no meu crescimento pessoal, me ajudaram nos momentos mais escuros e tristes que passei. Sou prova viva do poder das histórias que J. K. Rowling criou. Não consigo esquecer de relatos como o de Cassidy Stay que sobreviveram a violências e falavam de como os livros foram uma âncora de conforto.
Fiquei extremamente grato quando soube que a escritora visualizava a escola de magia e bruxaria como um ambiente acolhedor para a diversidade. Para alguém que sempre se identificou com o lado Queer e que se sentia suprimido e sufocado pela sociedade, foi a oportunidade de me sentir acolhido pela primeira vez. Várias vezes fui pego relendo ou simplesmente folheando os livros como um velho amigo.
Outro fato interessante é que as amizades também se permeavam pela magia. Todos sabiam que se uma pessoa gostava de Harry Potter, é porque essa pessoa era alguém que poderia confiar e deveria se ter perto. Os fãs se tornaram um imenso clã que se encontravam nos chats, sites e blogs, se apoiando e compartilhando do mesmo sonho em receber uma carta de uma coruja atrasada.
Mesmo com o passar do tempo é inegável o sucesso que a saga mantém. A força como continua a ser reimpresso, os conteúdos online produzidos e até os filmes derivados que são aguardados ansiosamente pelo público demonstram como a história se consolidou.
A fórmula do jovem bruxo foi buscada para tentar multiplicar o teor financeiro em outras franquias, mas nenhuma dela conseguiu o mesmo impacto. Não é à toa que Kevin Feige comentou o quanto foi influenciado pelo mundo mágico de Harry Potter, pela forma como ele foi construído e como todos os elementos se encaixam.
É preciso continuar discutindo e não esquecer a forma negativa que Rowling tratou o assunto da visibilidade trans, o apoio que deu ao Johnny Depp – que para minha opinião é um ator extremamente caricato e espalhafatoso para um papel do nível de Grindelwald -, e na forma controladora que se colocou no segundo filme de animais fantásticos – que foi considerado muito entusiasta, porém confuso. Contudo, é importante frisar o papel dessa grande autora como filantropa, seu empenho em tratar sobre saúde mental e da disponibilização gratuita de conteúdos online.  O fato é que tudo que se relaciona com Harry Potter tem um efeito muito grande e precisa ser sempre olhado com a dimensão que recebe.
Não por menos, quando fui assistir o Relíquias da Morte parte 2, percebi que tinha amadurecido e me tornara um adulto que continuaria fã, não importando o que ocorreria. Enquanto saia do cinema, pensei que poderia ser o único fã de um momento que iria ser esquecido, porém como o inigualável Alan Rickman descreveu e como todo fã de Harry Potter sente, esse mundo é para sempre.

Comentários